Gestores escolares estaduais e municipais, servidores do Tribunal de Contas do Ceará e representantes da sociedade participaram de encontro sobre a inclusão do estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena no currículo oficial da educação básica, na sede do TCE Ceará. O evento conteve palestras sobre a relevância da temática, prevista no art.26-A da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9.394/1996. Na oportunidade, foi divulgada a execução de auditoria de conformidade sobre inclusão do estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena no currículo oficial no ensino fundamental e médio (processo nº 37372/2023-4).
A abertura foi realizada pelo presidente do TCE Ceará, conselheiro Rholden Queiroz, que destacou o interesse da Corte de Contas em envolver, em suas fiscalizações, temas de impacto na sociedade. “Existem três motivos principais que motivam esse evento e esta auditoria: de ordem legal, de justiça e de sabedoria. Não basta só haver a celebração de datas comemorativas, é preciso haver ações que possam garantir a implementação do estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena na educação pública”, explicou o presidente, que complementou: “Precisamos nos apropriar dos conhecimentos dos povos originários do país e dos que contribuíram para a formação do nosso povo. A mentalidade que nos trouxe à situação atual não deve ser a mesma que vai nos tirar dela.”
O servidor do TCE Ceará, Manuel Salgado, que faz parte da equipe de auditoria – conduzida pela Diretoria de Fiscalização de Temas Especiais II, unidade da Secretaria de Controle Externo (Secex) –, informou os procedimentos e etapas deste trabalho. “As questões que serão investigadas nesta auditoria envolvem a existência de norma e de materiais didáticos e paradidáticos sobre o assunto, da formação dos profissionais de educação e da disponibilidade de recursos financeiros para realizar ações”, informou Manuel. Durante o encontro, foi distribuída a mais recente edição do Controle em Ação, que mostra, em linguagem simples e com recursos visuais, as atividades de planejamento desta auditoria de conformidade.
O primeiro painel expositivo foi formado pela professora da Universidade Regional do Cariri (Urca), Zuleide Fernandes de Queiroz, e pela secretária dos Povos Indígenas do Estado do Ceará, Juliana Alves Jenipapo. Zuleide Fernandes fez uma análise da legislação relacionada à temática, em especial, a Lei nº 10.639/2003, que alterou a LDB, para inclusão da história e cultura afro-brasileira, e estabeleceu o dia 20 de novembro como o Dia da Consciência Negra no calendário escolar; e a Lei nº 11645/2008, tornando obrigatório o estudo da história e cultura indígena e afro-brasileira nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio.
A professora também abordou o processo de apagamento histórico dos povos indígenas e negro, que foi intencional e decorreu por vários motivos, como a visão eurocêntrica de quem começou a escrever a história do Brasil, a desvalorização da diversidade étnico-racial e cultural e a falta de reconhecimento identitário e de pertencimento. “Precisamos reconhecer as desigualdades raciais, repudiar atitudes preconceituosas, inclusive em ambiente escolar, e abordar uma visão crítica da história”, apontou Zuleide, ao explicar os resultados esperados com a inclusão das temáticas no currículo das escolas.
A secretária Juliana Jenipapo, que é Cacika do povo Jenipapo-Kanindé, discutiu o papel das escolas indígenas, e como o conteúdo vivenciado nessas unidades de ensino pode contribuir para a educação como um todo. “Os professores de escolas indígenas entendem que o espaço de ensino vai além das paredes da sala de aula, incluindo o território como espaço de educação que, também, é um lugar sagrado”. A importância do território, conforme a palestrante, é central na cultura e na atuação da população indígena, tanto no Ceará como no país. “Existe o entendimento de que os povos indígenas protegem o seu patrimônio natural, e fazemos isso não apenas para a gente, mas para toda a sociedade e para as próximas gerações”. A Secretária Juliana citou autores, de origem indígena, que podem ser abordados em espaços de educação, como Célia Xakriabá (deputada federal), Elisa Ramos, Eloy Terena, Ailton Krenak e Daniel Munduruku.
Boas práticas na aplicação do estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena no currículo oficial de escolas de ensino público foram apresentadas pela diretora da Escola de Ensino Médio (EEM) Monsenhor Linhares, no município de Groaíras, Roniele Carvalho Magalhães. A palestrante descreveu o plano de ação desenvolvido na Escola, que envolveu letramento racial do corpo de professores, análise do currículo e reavaliação dos livros, escolha de disciplinas eletivas relacionadas com a temática, estudo da legislação étnico-racial e o estabelecimento de parcerias, por meio de palestras e atividades socioeducativas.
“Lidar com preconceitos é uma obrigação e uma construção diária com a participação de todos os atores escolares, e não só do gestor escolar. É preciso que o assunto seja discutido não só em ciências humanas, mas em todas. Na matéria de matemática, por exemplo, os alunos realizaram uma pesquisa sobre a identidade racial, utilizando conceitos de estatística”, explicou a professora.