The Intercept Brasil: “Como frear bilionários como Elon Musk” (ou “Brasil pode se orgulhar de ser um dos países que agem para frear o ímpeto fascistoide do homem mais poderoso do mundo”)

Artigo do jornalista João Filho (foto), no site The Intercept Brasil:

No mês passado, a Inglaterra viveu dias de terror com uma onda de ataques promovidos por grupos fascistas em diversas cidades. Depois que três crianças foram esfaqueadas e mortas, espalhou-se nas redes sociais uma informação falsa: o autor do crime seria um imigrante islâmico.

Foi o suficiente para que militantes da extrema direita saíssem às ruas para atacar violentamente imigrantes, incendiar carros, destruir mesquitas e confrontar policiais. Os ataques foram combinados principalmente pelo Telegram de Pavel Durov e pelo X de Elon Musk — dois espaços em que os fascistas podem desfrutar da tal liberdade expressão absoluta.

Musk deixou claro o que pensa. Em vídeo publicado no Twitter em que extremistas aparecem apontando rojões contra policiais, ele postou um comentário decretando que “a guerra civil é inevitável” no Reino Unido.

O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, respondeu que “não há justificativa” para a observação do bilionário e que há mais coisas que as empresas de mídia social “podem e devem fazer”.

Segundo o governo britânico, Twitter e Telegram não agiram com rapidez suficiente para remover o “material criminoso” mesmo após dias de protestos e precisam “assumir essa responsabilidade”.

Musk passou então a atacar diretamente o primeiro-ministro, alimentando uma conspiração de que a polícia estava, por ordem dele, tratando com mais severidade os “manifestantes” brancos de extrema direita do que as minorias do país.

Durante a onda de violência, a esposa de um vereador do partido conservador britânico escreveu no Twitter que os hotéis que abrigam refugiados deveriam ser incendiados e arrematou: “se isso me torna racista, que assim seja”.

Ela foi condenada por incitar violência e racismo depois de confessar o crime em um julgamento. Mesmo assim, o Twitter não considerou que ela violou suas regras. Um outro extremista foi condenado a 38 meses de prisão após confessar ter compartilhado as mesmas mensagens. Musk foi ao Twitter para criticar a decisão judicial, chamando-a de “confusa”.

No final do ano passado, a União Europeia abriu uma investigação contra o Twitter por falta de transparência e disseminação de desinformação. A conclusão foi a de que a plataforma está violando as leis locais.

Musk então fez acusações de chantagem contra o bloco europeu: “A Comissão Europeia ofereceu ao Twitter um acordo secreto ilegal: se censurássemos discretamente a fala sem contar a ninguém, eles não nos multariam”.

Esse é o padrão do afrontamento que o bilionário impõe contra vários países do mundo. Musk tem saído por aí atacando governos e desrespeitando frontalmente a legislação dos países em que suas empresas atuam.

Claro que há exceções. A depender dos seus interesses políticos e/ou financeiros, ele pode ser dócil a um ditador ou parceiro de um governante alinhado à extrema direita. O Twitter foi transformado em uma ferramenta desse projeto político de Musk.

Mas é bom que Musk coloque as barbas de molho. Estados de diferentes países estão se levantando contra o vale tudo dos bilionários donos de rede social. Pavel Durov, dono do Telegram, foi preso pela justiça francesa por ser cúmplice de crimes cometidos por meio da sua plataforma como tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e pornografia infantil.

Tudo isso porque, em nome da liberdade de expressão absoluta, Durov se recusa a implantar qualquer tipo de moderação no aplicativo e a compartilhar documentos exigidos pelas autoridades.

O Brasil pode se orgulhar em ser um dos países em que o estado está agindo para frear o ímpeto fascistoide do homem mais poderoso do mundo. Musk tentou fazer suas próprias leis e conspirar contra o estado brasileiro, mas está sendo devidamente enquadrado pelo judiciário.

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O Twitter foi suspenso do Brasil porque se recusa a bloquear perfis de investigados que conspiravam contra instituições democráticas e por descumprir sistematicamente decisões judiciais. Musk se recusa a pagar as multas — que hoje somam mais de R$ 18 milhões — e a apresentar um representante legal da empresa no país.

Carole Cadwalladr, colunista do The Guardian, exaltou a reação do Brasil: “É a primeira vez que um país ocidental impõe tal proibição (…). E, apesar dos esforços de Musk para retratar isso como o trabalho de um ‘pseudojuiz não eleito’ que quer destruir a liberdade de expressão para ‘fins políticos’, na verdade, isso se deve a outro conceito antiquado com o qual Musk não está familiarizado: o estado de direito”.

Mesmo com a suspensão do Twitter no Brasil, Musk segue atacando de maneira agressiva o ministro Alexandre de Moraes e até o presidente Lula, que nada tem a ver com as decisões da justiça.

Depois de passar meses atacando Moraes de todas as maneiras possíveis, o empresário agora se sente à vontade para fazer ameaças contra o governo brasileiro em sua rede social.

Nesta semana, ele insinuou que irá agir de alguma maneira para aprender ativos do governo brasileiro: “A não ser que o governo brasileiro devolva propriedades ilegais apreendidas do X e do SpaceX, nós vamos buscar reciprocidade na apreensão de ativos do governo também. Espero que Lula goste de voos comerciais”.

Trata-se de um gângster internacional que tem o apoio maciço do bolsonarismo e é tratado por parte da imprensa brasileira como um ativista da liberdade de expressão.

O homem mais rico do planeta é hoje o principal líder da extrema direita mundial, tendo roubado o posto que era de Steve Bannon — esquecido depois que foi preso e rompeu com Donald Trump.

Musk é um king kong chapado de ketamina com um metralhadora nas mão, disposto a destruir democracias em nome da sua ideologia disruptiva. Ele comprou uma das redes sociais mais influentes do mundo e deu passe livre para o esgoto nazifascista poder atacar negros, judeus, gays e todas às minorias que, segundo eles, ameaçam a civilização ocidental.

A prisão de Durov na França e o levante da justiça brasileira contra Musk sinalizam que os bilionários poderão começar a encontrar resistência em outros lugares do mundo. Talvez estejamos diante do início do fim de uma era de impunidade das empresas de mídia social.

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