Artigo do Roberto Maciel: “Onde se enfiou o senador antiaborto?” (ou: “Conveniências eleitorais e fundos mergulhos que estimulam”)

Opinião do jornalista Roberto Maciel, editor do InvestNE:

O empresário Luís Eduardo Girão (de pé, na foto acima), hoje senador pelo partido Novo e virtual candidato à Prefeitura de Fortaleza, foi brindado com a vitória pelo eleitor cearense, em 2018, por razões básicas:

  1. Era um nome com reais possibilidades de vencer Eunício Oliveira – contra quem a opinião pública e as leituras políticas mais à esquerda eram desfavoráveis naquele ano;
  2. Não havia se manifestado efetivamente como o bolsonarista que de fato é;
  3. Posava de conservador, apelando nas falas que fazia à defesa da família e a valores pacifistas;
  4. Opunha-se à descriminalização do aborto, assinando como patrono eventos como a Mostra de Teatro Transcendental e seguidas marchas contra o aborto;
  5. Opunha-se à descriminalização das drogas – inclusive pagando anúncios em jornais sobre “professores lombrados”.

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Passados seis anos daquele recorte, estando o País agora sob tormentosa discussão a respeito do Estatuto do Estuprador – como passou a ser chamado o projeto que criminaliza mulheres que possam abortar com mais de 22 semanas de gestação e as pune com penas maiores do que as que se aplicam a estupradores -, Girão sumiu dos debates.

Ninguém sabe, ninguém viu. Quando há discussões sobre aborto no Senado não se vê nem a sombra do parlamentar.

Não se trata de recuo para uma revisão de ideias. Nada disso. Há, sim, receio de ser visto na companhia de radicais, temor diante da derrota num debate público que envolve fé, lei, ética e saúde, medo de perder votos.

Girão, pretenso pré-candidato a prefeito, sabe que a imagem que cultiva corre o risco de sofrer lesões graves e que isso pode prejudicá-lo politicamente. Ele não reconsiderou nada do que pensa e divulga sobre aborto. Continua contrário aos defensores de direitos das mulheres, prossegue ameaçando quem interrompe a gravidez com o fogo do inferno, mantém-se questionando profissionais que atendem mulheres em situações do gênero, preserva a retórica “cristã” de que só Deus pode tirar a vida que dá.

É uma postura prudente diante da turbulência, admitamos, embora não seja corajosa.

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Foi o senador Luís Eduardo Girão quem, em abril do ano passado, em audiência no Senado, quis entregar ao ministro Sílvio Almeida (Direitos Humanos) um boneco de silicone que representa um feto (veja na foto abaixo). Sílvio rejeitou: disse que aquilo era desrespeitoso com mulheres que, sob violência indescritível, engravidam e que têm de se submeter ao aborto.

Mais: o ministro explicou que a pretensão feria a dignidade de mulheres e homens pobres, segregados na sociedade brasileira e pressionados pelos contrastes que atuam fortemente contra a igualdade de direitos. Ensinou que o gesto do senador cearense era um escárnio.

Sílvio Almeida foi polido, como sempre se mostra, mas enérgico.

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Enquanto o circo político está pegando fogo, Girão agora faz de conta que é agora é equilibrista e anda, com as pontas dos pés, sobre a corda que ser estirou entre opiniões, que afasta a lei do fanatismo pentecostal, que distingue a ciência do misticismo, que isola o respeito humano da crendice pseudo-religiosa, que diferencia a Constituição da interpretação canhestra de passagens de livros sagrados.

E, para isso, parece ter abortado o tema mais caro de sua curta carreira política.

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