Empresários e trabalhadores se alinham nas críticas à determinação do BC de subir juros

Empresários e trabalhadores se alinham nas críticas à determinação do BC de subir juros

Entidades do setor produtivo e de trabalhadores se uniram nas críticas à decisão tomada na quarta-feira (18) pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de elevar a taxa básica de juros (Selic) em 0,25 ponto percentual, para 10,75% ao ano. Apontada como “altamente prejudicial” à retomada do desenvolvimeno do país, a medida tende a favorecer apenas especuladores e rentistas do mercado financeiro.

A Confederação Nacional da Indústria afirmou que se trata de um “excesso de conservadorismo”, uma vez que a inflação no país está controlada. Em agosto, por exemplo, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial do país, registrou queda de 0,02%. “Os cenários econômicos, atual e prospectivo, principalmente de inflação, mostram que um aumento da Selic seria equivocado”, declarou Ricardo Alban, presidente da entidade,  também alertando para as consequências negativas sobre a atividade econômica, o emprego e a renda.

Segundo ele, a medida coloca o Brasil na contramão do que o resto do mundo está fazendo, especialmente os Estados Unidos, que reduziram suas taxas de juros em 0,5 ponto percentual no mesmo dia do anúncio do Copom.

“É emblemático que, no mesmo dia em que os Estados Unidos decidem baixar a taxa básica após meses, o Brasil resolva o contrário, elevar a Selic”, critica. “Torna a nossa diferença de juros reais ainda mais grave e cria condições desfavoráveis ao investimento no país. Até que ponto a especulação do mercado futuro de juros influencia as narrativas da expectativa de inflação futura?”, questionou. A entidade avalia ainda que o nível anterior da Selic, em 10,5%, era mais do que suficiente para conter a inflação.

Firjan

A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) também manifestou descontentamento, classificando a resolução como precipitada: “O elevado patamar de juros vem comprometendo setores estratégicos, em especial a indústria, e minando qualquer possibilidade de aumento da taxa de investimento do país. O setor industrial, embora tenha esboçado uma tímida recuperação nos últimos meses, ainda opera 15% abaixo de sua máxima histórica, registrada em maio de 2011”.

Construção civil

O setor de construção, que também depende do crédito para seu movimento, lamentou a decisão do Copom. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) avalia que a alta dos juros vai criar obstáculos para os investimentos em infraestrutura, além de reduzir o volume de depósitos na caderneta de poupança.

Em 2023, o setor registrou recuo de 0,5% em suas atividades, movimento pelo qual foram culpados os juros, que se mantiveram elevados, em 13,75%, entre agosto de 2022 e agosto do ano passado.

Leia maisO jugo dos juros: a asfixia da economia brasileira

Porém, neste ano, dados apontam para um reaquecimento da atividade. No segundo trimestre, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) afirmam que o Produto Interno Bruto (PIB) do setor cresceu 3,5%. Mas com o crédito mais caro, a CBIC aponta que os investimentos devem cair, e por consequência, o crescimento do país. “O desafio é desenvolver o Brasil sem as condições necessárias para o investimento acontecer”, comentou Renato Correia, presidente da entidade.

Supermercados

A Associação Paulista de Supermercados (Apas) informou que a decisão do Copom não surpreendeu, mas advertiu para os efeitos dos juros altos sobre o nível de atividade doméstica. “Vale lembrar que o Brasil já possui uma das maiores taxas reais de juros do mundo, o que agrava ainda mais os desafios ao crescimento econômico do país. Com uma taxa de juros tão elevada, é difícil fomentar o nível de investimento necessário para um crescimento sólido e consistente no médio e longo prazo da economia do país”, advertiu o economista-chefe da Apas, Felipe Queiroz.

Congresso Nacional

No meio político, a repercussão negativa também foi grande. Para a presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), a decisão do Copom foi ainda mais grave ao impactar negativamente os gastos em setores fundamentais. Em uma declaração contundente na rede social Bluesky, ela afirmou: “Além de prejudicar a economia, vai custar mais R$ 15 bilhões na dívida pública. Dinheiro que sai de educação, saúde, meio ambiente para os cofres da Faria Lima. Não temos inflação que justifique isso!”.

Igualmente inconformado com o anúncio do Copom, o deputado federal Odair Cunha (MG), líder do PT na câmara, fez um forte discurso na Casa, na mesma linha de Gleisi, mostrando o tamanho do prejuízo para o país e a população. “O que se investe em saúde, em educação, em geração de oportunidades, no combate a esses incêndios é muito pouco diante daquilo que vai pelo ralo todas as vezes que o Copom aumenta a taxa Selic. Nós não podemos admitir que o rentismo sequestre o recurso do povo”, declarou. brasileiro”

Centrais sindicais

O impacto da alta da Selic também preocupa as centrais sindicais. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) classificou a medida como um boicote à economia. “O Banco Central, por meio do Copom, segue praticando uma política monetária proibitiva (…) Cada 1% de aumento na Selic eleva em R$ 40 bilhões os custos com títulos. Esse dinheiro poderia ser investido no desenvolvimento do país, mas está sendo desviado para pagar juros”, criticou Juvandia Moreira, presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT).

Já para a Força Sindical, o aumento dos juros beneficia apenas os especuladores. “Essa estratégia de gradualismo, subindo a taxa aos poucos, penaliza de forma nefasta, principalmente, os menos favorecidos economicamente”, afirmou Miguel Torres, presidente da entidade. Ele destacou ainda que a medida tende a desestimular o investimento e o consumo, afetando as campanhas salariais e o poder de compra das famílias.

BC desalinhado com o mundo

Em um cenário global de queda dos juros, especialmente nos Estados Unidos, a decisão do Banco Central brasileiro – que, vale sempre ressaltar, é comandado pelo bolsonarista Roberto Campos Neto – está desalinhada com as principais economias do planeta. Enquanto países começam a reduzir suas taxas, o Brasil segue em uma política monetária que limita o crescimento econômico e agrava o custo do crédito para empresas e consumidores. 

A medida do Copom cria um impasse na economia brasileira, que precisa buscar soluções para reduzir os impactos negativos sobre o consumo, o emprego e o desenvolvimento. Para aumentar o lucro de uns, o Banco Central resolveu punir todo um país.

Felizmente, esse sequestro tem data para acabar: em dezembro, termina o mandato de Campos Neto. Resta esperar que o próximo presidente do BC conduza uma política econômica que beneficie verdadeiramente o Brasil e impulsione seu crescimento.