O reconhecimento legal de vínculo empregatício entre motorista de aplicativo e entregadores de prestação de serviços de transporte e as empresas donas de plataformas digitais que os contratam está sendo julgado no Supremo Tribunal Federal. Num paralelo que muitos não consideram exagerado, é como se estivesse em julgamento a escravidão no Brasil.
O status do processo no plenário do STF pode ser visto aqui:
Para o advogado Percival Maricato, este julgamento é um dos maiores desafios do Direito do Trabalho contemporâneo no Brasil.
– A sociedade, o Judiciário e o Legislativo precisam dialogar para construir soluções que garantam dignidade, proteção e segurança jurídica para todos os envolvidos, sem aumentar demasiadamente preço do serviço.
Nos últimos anos, o crescimento das plataformas digitais de transporte e entrega, como Uber, 99, iFood, Rappi, entre outras, trouxe à tona debates importantes sobre os direitos trabalhistas dos motoristas e entregadores. O principal ponto de discussão é se esses profissionais devem ser considerados autônomos ou empregados, com direito ao reconhecimento do vínculo trabalhista e aos benefícios previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
O trabalho por meio de aplicativos caracteriza-se pela flexibilidade de horários e autonomia na escolha das rotas e jornadas. Essas características são frequentemente utilizadas pelas empresas para argumentar que motoristas e entregadores são trabalhadores autônomos, sem subordinação direta, habitualidade ou exclusividade, condições que caracterizam o vínculo.
Muitos trabalhadores e sindicatos defendem que hé uma relação de subordinação – portanto, vínculo -, uma vez que as plataformas controlam o acesso aos clientes, impõem regras, aplicam penalidades e podem até mesmo desativar contas unilateralmente. Além disso, a remuneração depende quase exclusivamente do trabalho prestado na plataforma, caracterizando uma dependência econômica.
Na medida em que esta prestação de serviço se desenvolveu com crescimento exponencial, o Poder Judiciário brasileiro tem sido acionado com frequência para decidir sobre a existência de vínculo empregatício entre plataformas digitais e seus colaboradores. As decisões, no entanto, são divergentes e variam de acordo com o entendimento da Justiça do Trabalho e do STF
– Em diversos casos, juízes e tribunais trabalhistas reconheceram o vínculo, destacando a existência dos elementos clássicos da relação de emprego: pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação. No STF prevalece o entendimento de que a autonomia dos trabalhadores é incompatível com o vínculo empregatício tradicional, relata Percival Maricato.
O Tribunal Superior do Trabalho ainda não consolidou jurisprudência definitiva sobre o tema, mas tanto como nas instâncias inferiores, há propensão por reconhecer o vínculo
O reconhecimento do vínculo deverá ter impactos tanto para trabalhadores quanto para empresas e seus clientes. Para os motoristas e entregadores, isso representaria acesso a direitos como férias, 13º salário, FGTS, INSS e seguro contra acidentes de trabalho. Para as empresas, implicaria aumento de custos e mudanças no modelo de negócios. Com o vínculo, os serviços poderiam aumentar de preço, o que poderia reduzir a atividade econômica e a procura por clientes.