A crônica da Tuty: “Se eu não penso, eu não existo”

 

Texto da jornalista e escritora Tuty Osório:

Diziam-me há uns anos que se eu não estivesse no Instagram deixaria de existir. Não estou e estou aqui, vivinha. Por enquanto. Nunca se sabe. Nem eu mesma sei. Desde o início fui muito irritada com essas redes sociais impostas, esse mundo que a gente, teoricamente, é obrigado…

Nunca fui obrigada a nada, afirmo para a colega Theodora que me contesta. – Nem ao casamento, nem à maternidade, nem a esta ou àquela profissão, – insisto. Fui fazendo e escolhendo, nunca por convenção, regra, – alucino. – Tenho muito respeito, compaixão, paixão, – confesso. Sou aí, uma pessoa legal, com defeitos e limitações, – desespero-me.

Theodora, na verdade, não está discordando. Aproveita a trégua de silêncio e arremata. – Preocupa-me, há anos, as horas que as pessoas, de todas as regiões e estilos de vida, as horas que passam assistindo vídeos de conteúdo imbecil na internet, – arrisca.

Eu quero brigar e contra ataco sem ser sido atacada. – Internet é útil e pode estar a serviço de uma porção de facilidades, conhecimentos. Quantos canais interessantes no Youtube, – começo. – A difusão de temas que jamais chegariam a tanta gente de outro modo, – continuo.

Theodora é paciente. O convite era para uma taça de vinho. O intuito, comemorarmos a conquista de um projeto novo, batalhado por anos. Ela insiste, com suavidade – Não há aqui nenhuma revolta com a tecnologia. Essa pra mim é uma amiga da qual me aproximo mais a cada dia, – apazigua.

Balanço a cabeça afirmativamente e reforço – Devo a ela, à tecnologia, poder decidir publicar um livro impresso em 30 dias, em cinco cidades diferentes, num país continental como o Brasil, – rendo-me. – Desculpa, – pronuncio com sinceridade. – A minha bronca é com essa opção bizarra das pessoas em trocar o pensamento pela paralisia, – explico. Theodora aceita e me abraça. Estamos de acordo e somos aliadas.

Em outros cenários, tem valido a superficialidade, a alienação, a postura obtusa vestida de leveza. A Inglaterra divulga estudos que identificam algo como CÉREBRO PODRE, o estado necrosado para o qual caminha, na prática, a cognição. Há estudos mais antigos. Tenho observado essa anomalia no cotidiano. Conversas que não avançam, trocas verbais que se frustram, uma desolação de ideias, metáforas, alegorias. Sou grata por Theodora que não está assim.

O que me parecia implicância minha, é uma realidade ameaçadora. As pessoas estão ficando burras – o que é uma injustiça com o animal que por ser teimoso foi rotulado de pouco inteligente. Pretendia desistir de insistir no assunto e ganhei carga nova com a divulgação das ameaças ao nosso “órgão” pensador privilegiado.

Não é por nada, não. Como dizem em Portugal, não sejas trengo, calhau, palerma. No Ceará a gente manda o fie de uma égua ir pra baixa da égua.

De preferência aprendamos a ser pai d’égua. Olhemos para as nossas vantagens e façamos crescer nossas possibilidades. Distingamos o que não é inferno, para ampliá-lo, fazê-lo brotar mais e mais.

Coração sensato. Existe. Coração de caçador que vê a si mesmo ser a caça. Antes disso já tinha decidido salvar o alvo, mesmo sem saber que a si salvava. A bondade também se aprende.

*** ***

Tuty Osório é jornalista, especialista em pesquisa qualitativa e escritora.

São de sua lavra QUANDO FEVEREIRO CHEGOU (contos de 2022); SÔNIA VALÉRIA, A CABULOSA (quadrinhos com desenhos de Manu Coelho de 2023) e MEMÓRIAS SENTIMENTAIS DE MARIA AGUDA, dez crônicas, um conto e um ponto (crônicas e contos, também de 2023).

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