A Resenha da Tuty: “Fazedores de urbes”

Por Tuty Osório, jornalista e escritora:

Gosto de biografias. Tem gente que não gosta. Considera fofoca, alcovitice. Gosto. Não pelas informações picantes, inconfidências ou jocosidades. O que me atrai é o contexto da época, viajar no tempo ao encontro das peripécias, heroicas ou banais, que marcaram aquela vida. Biografam-se pessoas, terras, tempos, ritmos, instituições, plantas, objetos. Fascinante esse universo, tão mais atraente, quanto melhor o texto que o apresenta ao leitor. A seriedade da pesquisa importa, claro. Contudo, sou laçada por uma verve bonita, ousada, construída com recursos acolhedores de estilo, sem afetação.

Pra minha sorte, há uma leva brilhante de biógrafos brasileiros. Ruy Castro. Fernando Moraes, Mário Magalhães, Lilia Shwarcz, Heloísa Starling, e mais e mais que aqui não cito, para ficar nos que já li diretamente. Nos últimos dias ando agarrada a uma que fala de um grupo, os judeus sefarditas. Perseguidos pela Inquisição na Península Ibérica, refugiaram-se na Holanda, ocuparam o Brasil e fizeram Nova York. A biografia desse pessoal é uma imensa crônica que se baseia em cronistas através das épocas, registros cartoriais diversos, textos religiosos, históricos, literários. Sem a possibilidade de entrevistar gente da época, compreendida entre os séculos XVI e XVII, os levantamentos varam arquivos empoeirados, digitalizados e não. Pousam em objetos, abrigam-se em torres centenárias.

Sem enveredar pela polêmica que opõe sionistas e anti – sionistas, já que não se trata disso e sim, sou contra o genocídio que massacra o povo palestino e sei que o escrevente da obra aqui resenhada também é. Falo de uma história que vem do passado para nos mostrar formas de vida, organizações sociais e culturais reveladas, dramas revisitados a nos contar como se passou o que se passou. É um tipo de literatura que só proseia com fatos comprovados, justificados, contrapostos em versões múltiplas, caso as haja. Serve para pensar, repensar, aprender, sofrer, quem sabe, perdoar. Se não quiserem esse tema, há muitos à escolha.

Lira Neto, o autor, coleciona sucessos. A trilogia sobre Getúlio Vargas, a inédita face de José de Alencar, a solidão oculta de Maysa. Passando pelo Samba, pelo ditador Castelo Branco, Padre Cícero homem e santo, Edson Queiroz de verdade, a Universidade Federal do Ceará despida de mistificações, enfim, haja parágrafos. O último revelado foi Oswald de Andrade, o maldito maravilhoso. O mal comportado inspirador de romantismos e crenças divinas. Sucederá o ateu que cultuava Nossa Senhora, o Inventor do Nordeste, Luiz Gonzaga. Aguardamos com ansiedade bendita, premiados que seremos com mais uma sagração de saga alheia.

A nós entregue com rigor e graça.

INFORMAÇÕES:
ARRANCADOS DA TERRA, por Lira Neto (foto), Companhia das Letras, 2023.

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Tuty Osório é jornalista, especialista em pesquisa qualitativa, e escritora.

São de sua lavra QUANDO FEVEREIRO CHEGOU (contos de 2022); SÔNIA VALÉRIA, A CABULOSA (quadrinhos com desenhos de Manu Coelho de 2023) e MEMÓRIAS SENTIMENTAIS DE MARIA AGUDA, dez crônicas, um conto e um ponto (crônicas e contos, também de 2023).

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SÔNIA VALÉRIA, A CABULOSA
QUANDO FEVEREIRO CHEGOU
MEMÓRIAS SENTIMENTAIS DE MARIA AGUDA

Em dezembro de 2024 lançou AS CRÔNICAS DA TUTY em edição impressa, com publicadas, inéditas, textos críticos e haicais.

 

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