PORTAL INVEST NORDESTE_900x90

Artigo: “OAB, chega de associar pessoas negras à criminalidade!”

Por Alexandre Santos (foto à esquerda), professor de Geografia e homem negro:
Tem repercutido negativamente nas redes sociais uma campanha da OAB contra o golpe do falso advogado. A peça publicitária, exibida em um telão de LED em Fortaleza, usou a imagem de uma pessoa negra para ilustrar o estelionatário. A escolha não é apenas infeliz, ela é profundamente simbólica do racismo estrutural que ainda atravessa nossas instituições.
Quando uma entidade como a OAB, que deveria ser guardiã da ética e da justiça, reforça estereótipos racistas em sua comunicação, o dano é duplo. Primeiro, porque consolida na mente coletiva a equivocada associação de pessoas negras à criminalidade. Segundo, porque ignora o fato de que a advocacia é uma das profissões mais brancas do Brasil, com altíssima concentração de profissionais brancos nos espaços de prestígio e poder. Em um país marcado por séculos de escravidão e desigualdade, essa representação não pode ser vista como “mero detalhe”.
Não se trata apenas de um erro de comunicação, mas de um reflexo de como o racismo estrutural opera silenciosamente, até mesmo nas instituições que deveriam combatê-lo. O resultado é a perpetuação de uma imagem social que recai sempre sobre os corpos negros, que já sofrem as maiores taxas de violência, exclusão e encarceramento.
Sou docente de geografia e sempre levo aos meus alunos o dever de pensar criticamente sobre nossa situação. O grande geógrafo Milton Santos abordou o racismo como a privação da cidadania plena, a “cidadania mutilada”, que atinge os negros no Brasil, tratando a questão negra não apenas como um problema dos negros, mas de toda a sociedade brasileira. Ele criticou a normalização da desigualdade racial, chamando-a de “apartheid à brasileira”, e defendeu a importância de se discutir o racismo de forma a construir uma autoestima coletiva, a partir do que ele via como um discurso reverso, focado no poder branco e não no ressentimento negro, que considerava ineficaz.
Como professor negro, lidando diariamente na sala de aula com tantos jovens negros e marginalizados, não posso naturalizar esse tipo de mensagem. É urgente que as pessoas que criaram esse anúncio revejam sua postura, reconheçam o equívoco e adotem práticas de comunicação responsáveis e inclusivas. A luta contra golpes e crimes deve ser firme, mas jamais às custas da dignidade de um povo historicamente excluído.
Precisamos de uma sociedade que seja plural, diversa e comprometida com a justiça social em sua integralidade. 
Combater o racismo estrutural começa por reconhecer que imagens como essa não são neutras: elas moldam percepções, reforçam desigualdades e têm consequências reais na vida de milhões de brasileiros negros e brasileiras negras.

Compartilhe o artigo:

ANÚNCIOS

Edit Template

Sobre

Fique por dentro do mundo financeiro das notícias que rolam no Ceará, Nordeste e Brasil.

Contato

contato@portalinvestne.com.br

Portal InvestNE. Todos os direitos reservados © 2024 Criado por Agência Cientz