Na semana passada, escrevi nesta newsletter – que estou ocupando temporariamente durante as merecidas férias da Marina Amaral – sobre a patifaria de Zuckerberg e seu achaque contra a checagem de fatos. Pois uma semana depois, o assunto que mais mobiliza o país não por acaso tem relação com redes sociais, desinformação, poder e dinheiro: o Pix.
A esta altura, o governo Lula já recuou da portaria que alterava o escopo da fiscalização da Receita Federal sobre transações financeiras. O recuo acabou “passando recibo” da derrota do governo e da vitória da oposição, coroando mais uma viralização do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) nas redes sociais.
Pois abram-se as trincheiras. O quiprocó do Pix esgarçalhou a República. De um lado, perfis alinhados à esquerda se estapearam entre criticar ou defender fervorosamente o governo e até mesmo em acusar, sem provas, de que a Meta teria inflado o alcance do deputado.
Do outro lado, perfis alinhados à direita surfaram na desconfiança contra o governo, em parte, usando como espantalho a taxação das “blusinhas”, e até fizeram subir a hashtag Impeachment no X, de Elon Musk – em mais uma clara demonstração de como os trending topics do antigo Twitter são facilmente capturados por mobilizações de grupos políticos.
Pois bem, considerações à parte, meus 20 centavos não taxados sobre a crise do Pix serão sobre o jornalismo.
Em primeiro lugar, há uma enorme dificuldade por parte do jornalismo em informar a população sobre economia. Em parte, porque é, sim, um tema difícil, complexo. Mas também porque o noticiário econômico, tal qual o político, em muitos casos, acaba refém de jargões e expressões técnicas e parece falar para especialistas.
Essa é uma prática que, felizmente, tem sido combatida com uma tendência a se produzir cada vez mais textos explicativos sobre economia, mas que, infelizmente, chegam numa época na qual o consumo e a credibilidade do jornalismo estão em baixa, e ainda precisam lidar com a concorrência com as redes.
Aí, novamente, o jornalismo declaratório, sobretudo quando reproduz falas de políticos, acaba se tornando mais um problema que solução. Uma das matérias que vi, reproduziu uma fala de Jair Bolsonaro (PL), obviamente falsa, de que mudança na fiscalização seria “uma forma bastante clara” do governo monitorar seus “inimigos”. Chega a ser surreal que Bolsonaro, cujo clã é denunciado por comprar dezenas de imóveis em dinheiro vivo, seja alçado a comentador nesse contexto, sem questionamentos.
“ O trabalho do jornalismo nesse contexto, por mais difícil que seja, deve ser o de seguir os caminhos da apuração. Seja para explicar à população os efeitos reais das medidas do governo e aproximar a economia da realidade, seja para seguir o dinheiro dos poderosos e expor como eles fazem sim suas tramóias para acumular riqueza, sonegar e influenciar os rumos do país”.
Aliás, neste momento que escrevo, já há políticos impulsionando conteúdos nas redes sociais para ganhar visibilidade com a crise. Bruno Marini, do Novo, que quase concorreu à prefeitura de Barra Mansa, no Rio de Janeiro, nas últimas eleições, está circulando dois anúncios, pelos quais pagou até R$ 200, para associar a revogação do Pix a uma acusação sem provas de que é o por isso que o “governo quer regular as redes sociais”.É aí que novamente se reforça como é importante o jornalismo investigar as redes sociais. Elas são o ambiente onde esse tipo de batalha política tem sido travada e, muito convenientemente, lucram com todos os lados: enquanto políticos de direita tentam surfar na onda com suas postagens, o governo federal foi o maior anunciante de conteúdos políticos nas redes da Meta nesta semana, com R$ 43 mil pagos para impulsionar postagens sobre economia, mas de assuntos favoráveis, como programas de qualificação profissional, empreendedorismo e resultados de trabalhos com carteira assinada.
É preciso continuar seguindo o dinheiro. Nas redes e fora delas.