Maria Martha, da Agência Pública: “China, EUA e a gente”

Maria Martha Bruno, Autor na Agência PúblicaDa jornalista Maria Martha, coordenadora de Parcerias Internacionais da Agência Pública:

Aqui senti um misto de satisfação pelo feito histórico de “Ainda Estou Aqui” e desilusão pelo fato de a gente ainda ser tão pautada pelo que vem do lado de cima da Linha do Equador.

“Eles precisam muito mais de nós do que nós deles. Na verdade, nós não precisamos deles”. As palavras de Donald Trump sobre sua relação com o Brasil e a América Latina mostram como nossa região é útil às bravatas e barganhas do presidente dos Estados Unidos, com esse tom imperialista e de naftalina. O desprezo com que se refere à região revela, precisamente, o quanto ele precisa dela.

Além do mercado comercial da América Latina, dos recursos naturais e da força de trabalho que ocupa vagas rejeitadas pelos blue collars norte-americanos, os EUA de Trump precisam de nós para alimentar a guerra cultural que sustenta o discurso de um país “coitadinho decadente”, ridicularizado pelo mundo, com uma economia em crise e infestado de criminosos latinos. “Os crimes diminuíram 74% na Venezuela porque mandaram todos os criminosos para cá”, disse ele no dia da posse. Dá pena mesmo.

Elon Musk, CEO da nova oligarquia de subservientes ao governo, também precisou do Brasil quando seu X (ex-Twitter) foi suspenso por 40 dias pelo Supremo Tribunal Federal. Mas quando ele sentiu o impacto de perder uma das maiores e mais ativas bases de usuários do mundo, Musk cedeu e cumpriu uma determinação simples da nossa legislação: qualquer empresa internacional que opere no Brasil precisa ter ao menos um representante legal em território nacional.

O que a China tem a ver com isso?

Mas se você já leu tudo sobre a posse de Trump ou já está cansada/o ou evitando o assunto, fique atenta/o a outra supremacia que paira sobre nossas cabeças. Esta semana publicamos mais um furo de reportagem sobre a China e trabalho escravo no Brasil. Nossa reportagem está totalmente conectada com o novo momento em que o mundo ingressou na segunda-feira da semana passada.

A principal concorrente da Tesla de Elon Musk, a montadora chinesa de carros elétricos BYD, começou a monitorar seus funcionários após denúncias de maus-tratos a trabalhadores no Brasil. Nós já havíamos revelado as condições análogas à escravidão a que esses imigrantes chineses estavam submetidos. Segundo a nova denúncia, a empresa instalou câmeras, proibiu fotos e implementou um software do governo chinês em seus computadores.

O soft power expansionista do presidente chinês Xi Jinping nos afeta tão diretamente quanto a geopolítica protecionista de Trump. A BYD instalou no Brasil sua primeira fábrica na América Latina e tem planos de levar seu segundo empreendimento para o México em 2025. Apesar dos problemas relatados, a empresa chinesa conta com o apoio do presidente Lula e dos governos locais onde está situada a fábrica.

Ainda assim, isso não impediu que nossas instituições funcionassem, como no episódio em que Musk cedeu à Suprema Corte do Brasil: após a denúncia da Agência Pública, o Itamaraty suspendeu a emissão de vistos temporários para a BYD, e o Ministério Público do Trabalho resgatou os 163 trabalhadores chineses que estavam em condições degradantes na fábrica.

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