Completaram-se exatos sete anos desde que um pesadelo começou.
Foi a noite em que Mari Ferrer foi drogada e violentada em uma boate em Florianópolis. Pode até parecer um passado distante para os perpetradores, já que eles jamais foram responsabilizados.
Mas Mari ainda não conseguiu justiça. E hoje o Intercept está lutando contra uma investigação policial que busca revelar nossas fontes, além de vários processos criminais e civis gravíssimos.
Estamos brigando para reverter a condenação de nossa repórter a um ano de prisão e indenização de R$ 400 mil, por uma investigação publicada em 2020 que chocou o Brasil, envergonhou o judiciário catarinense e resultou na Lei Mari Ferrer.
Desde a publicação, autoridades estaduais buscam vingança em uma série de ações judiciais que já provocaram o repúdio da ONU, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e do STF.
Agora, esse pesadelo pode ficar ainda mais assustador em breve: estamos esperando novas decisões judiciais a qualquer momento, e nos preparando para o pior. Isso pode significar novas penas de prisão e indenizações estratosféricas, além de mais censura e violações constitucionais.
Não nos intimidaremos e não deixaremos de buscar justiça até que todas as decisões contra a repórter Schirlei Alves sejam revertidas.
Mas lutar contra a polícia e o judiciário em seu próprio quintal não é fácil, e certamente não é barato. É por isso que criamos nosso Fundo de Defesa Legal. É uma forma de nossa comunidade mostrar sua solidariedade com Schirlei e garantir que o Intercept Brasil sempre terá os recursos necessários para enfrentar a corrupção e a injustiça.
Além desse caso, estamos enfrentando uma onda sem precedentes de assédio judicial, com pelo menos 25 processos abertos, movidos por golpistas, políticos extremistas, criminosos ambientais, mineradoras e demagogos que prefeririam que nosso jornalismo independente não existisse.
O caso Mari Ferrer
Em 2020, o Intercept Brasil publicou a gravação em vídeo de um processo judicial no qual Cláudio Gastão da Rosa Filho, advogado de defesa, assedia e humilha Mari Ferrer, que a Polícia Civil alegou ter sido estuprada pelo rico empresário André de Camargo Aranha no exclusivo clube de praia Café de la Musique em 2018, depois de ser drogada por seus cúmplices.
Na audiência, o promotor e o juiz não intervieram efetivamente, ignorando a súplica chorosa de Ferrer. “Excelentíssimo, eu tô implorando por respeito. Nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada. Pelo amor de Deus, gente, o que é isso?”, diz Ferrer na gravação.
Apesar das evidências físicas e em vídeo e dos depoimentos de testemunhas que mostravam Ferrer tropeçando e enrolando as palavras, Thiago Carriço de Oliveira, o promotor do caso, argumentou que não havia como o empresário saber que não havia consentimento durante o ato sexual. Aranha foi absolvido pelo juiz Rudson Marcos com base nesses argumentos.
Nossa reportagem imediatamente provocou uma tempestade nacional e levou a uma nova lei federal que pune operadores do sistema de justiça que revitimizam vítimas de agressão sexual durante o processo jurídico.
As revelações também provocaram uma resposta judicial agressiva dos três homens no vídeo, que processaram a repórter do Intercept Brasil tanto criminal quanto civilmente.
Dois dos seis processos contra Schirlei levaram a uma condenação a um ano de prisão em regime aberto e a uma indenização de R$ 400 mil a Marcos e Carriço, o juiz e o promotor, por supostos crimes contra a honra – valor equivalente a mais de cinco anos do salário médio de um jornalista.
O Intercept Brasil, que está assumindo todos os custos judiciais, recorreu da decisão; três processos civis continuam se arrastando, enquanto um processo criminal foi encerrado.
O juiz Marcos foi punido pelo Conselho Nacional de Justiça, em uma decisão unânime, por sua omissão na proteção de Ferrer – poucos dias após a condenação de Schirlei. O Ministério Público também abriu uma investigação disciplinar contra Carriço, que ainda está pendente.
Além de processar Schirlei, o juiz Marcos entrou com pelo menos 182 processos para silenciar as pessoas que postaram uma hashtag para discutir o caso online – entre elas várias celebridades feministas de destaque.
“Meu único desejo era expor a verdade e foi isso que fiz. Esta perseguição já me causou danos irreparáveis. É uma tentativa de silenciamento e intimidação não apenas contra mim, mas contra o jornalismo investigativo brasileiro”, afirmou Schirlei.
“Agora, espero que o sofrimento de Mari Ferrer e o meu possa levar a mudanças para que mais mulheres não tenham que passar por aquilo a que fomos submetidas. Nós merecemos o melhor”.


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