Mais de 40 entidades representativas do setor de bebidas assinaram carta-aberta se posicionando, em alinhamento com a avaliação da Receita Federal, a favor de um sistema de controle de produção de bebidas que atenda às tecnologias atuais e que não gere custos desnecessários à União, ao consumidor e às indústrias.
O pivô desse movimento foi a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que determinou o religamento do Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe), desligado em 2016 em devido a altos custos, obsolescência e denúncias de corrupção. Em 60 dias, de acordo com a norma do TCU, o sistema deveria ser religado nos mesmos moldes de quase 10 anos atrás.
O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, concedeu, em 4 de abril, liminar para suspender os efeitos das decisões do TCU. A medida foi tomada no âmbito do Mandado de Segurança 40.235, impetrado pela União em 3 de abril.
Na decisão, o relator reconheceu a existência de fundamentos relevantes que indicam a competência legal da Receita Federal para definir e modificar obrigações acessórias, conforme previsto no art. 35 da Lei 13.097/2015, no art. 16 da Lei 9.779/1999 e no Decreto 8.442/2015. O ministro também destacou o risco de violação ao pacto federativo, à medida que o retorno ao Sicobe poderia impactar negativamente a arrecadação nos entes subnacionais.
A decisão ressalta ainda o risco orçamentário e fiscal, ao apontar que a reativação do sistema poderia representar uma renúncia de receita estimada em R$ 1,8 bilhão por ano, sem cobertura na Lei Orçamentária Anual — o que configuraria ofensa ao art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
A Receita Federal e a Advocacia-Geral da União sustentam que o Sicobe é tecnicamente inadequado, juridicamente vulnerável e economicamente inviável. O retorno a esse modelo, segundo os argumentos acolhidos pelo STF, seria um retrocesso diante dos avanços tecnológicos já implementados, como o uso do Bloco K da Escrituração Fiscal Digital (EFD).
“O setor de bebidas alcoólicas reunido na Associação Brasileira de Bebidas (ABRABE) vê o momento como uma oportunidade de modernização e evolução tecnológica dos controles fiscais, pelos quais prezamos e, justamente por isso, não poderia concordar com o retorno do antigo sistema nos moldes do passado”, explica Cristiane Foja, presidente-executiva da ABRABE. Junto de outras entidades do setor produtivo, a associação assinou o Manifesto contra a determinação do TCU.
As entidades representadas defendem um sistema de controle digital, eficiente e sem custos, alinhado com o novo sistema tributário e as práticas de países da OCDE.
Com a liminar, permanecem válidos os Atos Declaratórios Executivos 75 e 94/2016, que desobrigaram o uso do Sicobe. O caso segue em tramitação para julgamento de mérito no STF.
Pontos-chave da decisão liminar do STF (MS 40.235)
Fundamentação legal da Receita Federal
Art. 35, parágrafo único, da Lei 13.097/2015: confere à Receita competência para definir forma, limites e prazos de aplicação da obrigatoriedade do Sicobe.
Art. 16 da Lei 9.779/1999: assegura à Receita o poder de regulamentar obrigações acessórias.
Decreto 8.442/2015: permite expressamente a dispensa do Sicobe em caso de inviabilidade técnica.
Limites da atuação do TCU
O TCU não pode anular atos administrativos regulares com base em controle abstrato de constitucionalidade.
O STF reafirmou que não cabe ao TCU invadir competências da administração tributária.
Impactos orçamentários e fiscais
Reativar o Sicobe poderia gerar renúncia fiscal de até R$ 1,8 bilhão por ano, sem previsão orçamentária.
A decisão cita possível violação à Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 14, LRF).
Precedente jurisprudencial
O STF reiterou jurisprudência sobre a inconstitucionalidade de controle abstrato por Tribunais de Contas (MS 35.410 e outros).
O relator, ministro Cristiano Zanin, destacou a natureza instrumental das obrigações acessórias, que devem ser proporcionais e eficazes.
Inadequações do Sicobe
Jurídicas: terceirização irregular da fiscalização.
Técnicas: vulnerabilidades apontadas pelo Inmetro.
Econômicas: custo desproporcional (R$ 1,4 bi/ano), equivalente à contratação de 4.300 auditores fiscais.