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Opinião: “Precisamos falar do ‘BCdoB'” (Parte 5)

Artigo do jornalista Osvaldo Euclides de Araújo, graduado em Economia e mestre em Administração. Foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do site Segunda Opinião:

Um sistema bancário precisa ser uma espécie de concessão pública. Sem abusos, o poder legítimo estabelece critérios e condições. Cumpridas essas exigências, concede-se a autorização de funcionamento. Sim, é necessário esse regramento e esse controle. É fácil entender: se um banco não cumpre funções (próprias de todo banco) de interesse do desenvolvimento do país, ele não deve ser autorizado a funcionar. Sem cumprir essas funções e missões de interesse geral, um banco não passa de uma casa de agiotagem e especulação.

Essas visões precisam ficar bem claras. Para estabelecer essas exigências, regular, fiscalizar e direcionar a atuação do sistema bancário existe a figura de, como o nome sugere, um banco central, que tem funções diversas, importantes. Por exemplo: um banco central cuida da saúde financeira dos bancos (isso é do interesse do país, porque empresas e pessoas depositam seu dinheiro lá). Também cuida da liquidez do sistema bancário (é preciso estar sempre solvente).

Um banco central também pode estimular ou desestimular o crédito em termos gerais, porque há ferramentas e instrumentos adequados, e isso é decisivo para o país, porque sem crédito novos negócios não nascem, negócios pequenos não crescem, as empresas ficam sem capital de giro, o consumidor fica sem financiamento.

Um sistema bancário mal regulado e mal direcionado pode até não ser culpa de si mesmo. Pode ser fraqueza do banco central. Se o banco central não exerce firme e competentemente suas funções, o sistema bancário inteiro pode se desviar de sua função econômica sistêmica. Se isso acontece, algo também está muito errado, esse desvio é lesivo ao país e à sua população, às empresas e ao futuro,  e coloca em risco até o que já foi construído. Imaginem um banco central onde taxas de juros e taxa de câmbio oscilam como uma gangorra, ou como uma montanha russa. O país fica atônito, empresários freiam, o consumidor se retrai, tudo fica para  depois, e depois, e depois. Podem se perder muitas e grandes oportunidades. 

O crédito é vital. Mas o crédito está diretamente conectado à oportunidade, um momento, um impulso que vira decisão. O crédito não pode pedir uma guerra para ser obtido.

O crédito tem que estar disponível, tem que estar acessível, tem que ser oferecido, se possível automaticamente — para isso bancos pedem cadastros, comprovantes de renda, patrimônio e referências ao cliente.

O custo do crédito tem que ser razoável, de mercado, conforme padrões internacionais (porque a competição é global).

O empréstimo tem que ter prazo longo o suficiente, tão longo quanto possível e necessário, também há padrões. Às vezes, precisa ter prazo de carência, conforme circunstâncias.

E a demanda dos bancos por garantias não  deve ser exagerada, burocratizada e ter o objetivo de levar o risco a zero. Quem busca risco zero não deve ser banqueiro.

Num país pleno de oportunidades e cheio de empreendedores, todo produtor agropecuário, todo prestador de serviços, qualquer comerciante ou industrial conhece este assunto. E já viveu a experiência deste obstáculo (na oferta, no custo, nos prazos e na exigência de garantias). Eles a traduzem assim: só obtém crédito quem prova que não precisa.

O que tem acontecido com o crédito no Brasil nos últimos vinte anos é uma demonstração de que nem o Banco Central, nem o próprio sistema bancário têm realizado a contento uma de suas missões que é oferecer crédito em condições de contribuir para o desenvolvimento do pais, para o crescimento e fortalecimento das empresas e para o atendimento das necessidades e desejos das pessoas físicas.

Como assim?

Em 2004 o volume total de crédito no Brasil representava em torno de 25 por cento do valor do PIB (produto interno bruto, valor da produção total de um ano). Em 2010 esta proporção tinha saltado de 25 por cento para um número  perto de 50 por cento do PIB. E ai parou nessa patamar, e desde então apenas  oscila nessas vizinhanças.

Ou seja, os banqueiros não emprestam mais hoje (2024) do que em 2010. O que há de errado com as empresas e as pessoas no Brasil? Talvez nada. O erro deve estar ou no Banco Central, que é o órgão regulador de todo o sistema bancário brasileiro, ou no próprio sistema bancário brasileiro. Nos dois casos, algo esta errado e, se não for corrigido, a economia do país continuará voando como galinhas e andando como um carro com freio de mão puxado.

Ora, mas por que será que os banqueiros não emprestam muito mais para lucrar muito mais? É que o sistema bancário nacional está regulado (e acomodado) de tal maneira que ele não precisa fazer isso (correr riscos para lucrar mais): não precisam emprestar nada a mais.

Observe, os bancos não precisam emprestar para remunerar os depósitos que recebem do distinto publico. Os bancos podem depositar o dinheiro no Banco Central e o dinheiro rende. Rende muitio, rende um dos juros mais altos do mundo, com segurança total, com liquidez plena. 

Comparado com a moleza de cobrar dezenas de bilhões de reais em tarifas de manutenção de conta ou aplicar em títulos públicos ou especular com câmbio, emprestar dá muito trabalho, traz risco e não tem liquidez plena. Se o banco pode ganhar o mesmo lucro sem esses, digamos, inconvenientes…

Bem, este é um problema que o Banco Central deveria ter enfrentado e não enfrentou. Ele precisa explicar por que razão não o enfrentou e não o enfrenta.

Sem crédito acessível, barato e adequado, vai ser voo de galinha e marcha de carro com freio de mão puxado.

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